sábado, 7 de maio de 2011

Divagando sobre o homem


Curiosa a forma como Antony Gormley concebe o homem. Um emaranhado de arames farpados, um toque se quer e já será ferido. Nada humano nesse ser, apenas cinza, vazio, e em alerta; assim como uma máquina, assim como uma cerca elétrica, para não deixar que ninguém, que diga-se de passagem trata-se de outro "humano" ultrapasse as barreiras a qual ele delimitou.
Poderíamos dizer que Antony está sendo um tanto pessimista em representar o homem assim, mas basta olharmos suas atitudes para nos depararmos com o monstro que o homem se transformou. Sempre alheio aqueles que não fazem parte de seu circulo social, sempre ligado intimamente ao seu celular, ao seu ipod, ao seu ipad, ao seu e-book, e a todas as tecnologias que estão por aí e que não param de chegar a cada dia que se passa. Acabou as conversas no ponto de ônibus, ou com a pessoa que sentou ao seu lado no transporte público, agora você tem a companhia de sua máquina. Acabou os encontros cotidianos com o colega da feira, aliás, falar em feira já se tornou algo demodê, as pessoas hoje vão aos hipermercados e já não conversam com ninguém, não formam vínculos, laços com o cara do caixa, da padaria ou do açougue, afinal o mercado é tão grande e cada dia você faz compra no qual a tv fez a melhor propaganda.
Estamos trocando valores reais, pessoais, por relações banais e meramente virtuais. Não ligo para meu melhor amigo para lhe desejar feliz aniversário, mando um scrap no orkut, ou melhor posto algo para ele no facebook que está mais na moda.
Pensando nisso vemos o quanto Antony é realista ao retratar o homem assim:


Um aglomerado de pedras. Essa imagem é tão fria, uma pessoa sem face, sem identidade. Bem, falar em identidade na nossa sociedade é quase que uma piada. O mercado comprou a identidade dos povos e hoje o povo é uma simples reprodução daquilo que está vigente. Não importa o que seja, eu não tenho mais autonomia, eu faço o que me manda a revista, a novela, os reality shows. O capitalismo está aí para todos os gostos, desde as patricinhas até os hippies que hoje podemos chamá-los de hippies de cartão de créidto, o filho do burguês que se revoltou contra o papai e então resolveu fazer alguma faculdade de ciência humana, anda pela faculdade com a calça da zoomp rasgada. Não há mais identidade, acabou-se as utopias.
O negro se embranquece, alisa o cabelo, pinta-o de loiro. E se este não se sujeitar a tais padrões será escorraçado pela sociedade do espetáculo.
Os homossexuais se camuflam na aceita heterossexualidade, o amor entre iguais é reprimido perante a igreja, perante as leis; a liberdade de se amar é proibido nesse mundo em que só é autorizado amar seus bens que por sua vez são materiais.


E assim seguem os homens nesse sistema que transforma humanos em andróides. A rotina e o trabalho alienado transformam o homem em seres que aceitam uma norma para si e a repetem. Já não se colocam no papel de pessoas criativas que se faz diferenciar do animal pelo uso da razão, da criação, do pensamento critico, do homem ativo politicamente que a partir da ação política obtém conquistas, quebram barreiras, sejam elas a do preconceito, da ditadura da beleza, ou do mercado como foi dito. Mas não, o homem se coloca no papel de um ser passivo que sobrevive a cada dia a espera de um milagre ou de uma justiça que está por vir.


Quem é esse homem que em pleno século XXI acredita em um ser invisível, que é justo e nos fará justiça após nossa morte. E enquanto não morremos para poder presenciar a dita justiça permanecemos nessa barbárie. 
Para que agir se há quem fará algo por todos nós? Enquanto nada acontece vamos levar a vida.
E  assim pensa caminhar a humanidade quando na verdade são levadas por esteiras que caminham por elas.

Filá.


terça-feira, 5 de abril de 2011

Poema do sistema



Mundo oco, mundo vazio,
O mundo, nós mesmos,
Seres vivos, apenas vivos,
Não que vivam,
São meras engrenagens de uma máquina mortal,
e que assim seguem mecanicamente sobrevivendo a barbarie
Por conta de uns intrépidos seres que governam a máquina do mundo
nos sujeitamos a ser seres mudos guiados por cegos ambiciosos
Sua ambição nos consumir o espírito e nos fazer consumir seu lixo

quinta-feira, 10 de março de 2011

Guerra dentro da gente



Não chega ser necessário participar ativamente em uma guerra, ver mortos e feridos, pegar em armas para dizer que se sabe a arte da guerra.
Simplesmente a vida em sua luta diária, nem tanto para vencer mas somente para sobreviver nos faz ter a guerra dentro da gente. E é disso que fala a fábula de Paulo Leminski, Guerra Dentro da Gente, em que Baita uma pequena criança de família pobre e de pai alcoólatra enfrenta sua primeira luta ao ser seduzido por um velho que lhe oferece ensinar a da arte da guerra, e o menino encantado aceita e acaba sendo vendido como escravo, depois vai trabalhar em um circo alimentando os elefantes e tigres. Mesmo diante dessa triste realidade, sente falta da família mesmo não sendo das melhores e encontra poesia no comportamento dos animais que cuidava no circo. Os elefantes felizes e amigáveis, deixavam Baita subir em suas costas e sonhar em conquistar o mundo ao contrário dos tigres, que eram bravos e raivosos, ficavam sozinhos e pareciam sempre querer comer o pobre menino. Assim eram os animais e com eles Baita aprendeu a incorporar suas ações conforme a situação, bravo e feroz ou amigo e carinhoso.
Por ironia do destino quem foi tirar Baita dessa vida de alimentador de animais de circo foi o mesmo velho que o vendeu como escravo e partiu com ele sempre ouvindo a promessa de que este iria lhe ensinar a arte da guerra. Baita aprendeu a caçar e andar na floresta, até que chegam em uma ilha de pescadores de pérolas, a maioria deles não não possuia pernas, porque foram arrancada por tubarões ao mergulharem a procura das pérolas. Essa gente era muito sofrida e percebeu que tanto esforço e sacrifício era em vão, pois em um belo dia chega um enorme navio com uns marinheiros para levar as pérolas capturadas. E Baita percebe como a vida é injusta, as pessoas que sacrificavam suas próprias vidas pelas pérolas não ganhavam nada com isso, pois em pouco tempo vinham os marinheiros e as levavam, pagando muito pouco por elas.
Baita e o Velho pegam carona nessa navio e vão viver uma aventura pelos mares, pensaram ser uma aventura, mas enquanto estavam no barco tiveram que trabalhar muito. Quando chegaram em uma pequena cidade Baita e o Velho desceram do barco e foram desbravar esse novo lugar, lá havia uma feira onde vendiam muitas jóias, o velho roubou uma jóia e colocou na bolsa de Baita, o vendedor presenciou todo o furto e chamou os seguranças, Baita acusou o velho que foi levado como preso. As pessoas daquela cidade acharam Baita um homem, já não mais um menino, muito forte e o convidaram para fazer parte da guarda da cidade. Ele aceitou e foi sendo cada vez mais reconhecido por suas ações, ele até salvou a filha do rei que havia sido seqüestrada, e ao ter a companhia da princesa se apaixonou por ela. Mas ela ao sair do palácio e conhecer o mundo se apaixonou por todos e resolveu sair pelo mundo fazendo o bem ao próximo. Um dia Baita resolve voltar para o pequeno vilarejo onde nasceu, vê sua antiga casa coberta de mato e ao olhar para uma ponte onde tudo começou ele vê uma pessoa, chega mais perto e é o mesmo velho.
Nessa pequena e aventurada fábula podemos perceber a freqüente guerra que Baita enfrenta para poder sobreviver e o menino se fortalece e acaba descobrindo o mundo. A prometida arte da guerra que o velho iria ensinar a Baita foi vivenciada pelo próprio menino que aprendeu sozinho como se faz para sobreviver.






Filá.

segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

Destruição para a construção


Um carro sendo destruído por uma pedra. Pedra, biologicamente falando, elemento rígido, cinza. Humanamente falando, impassível, apático.
Carro, máquina feita por humanos, tão bom, nos locomove, tão mal, poluí, mata, gera transito, que gera stress, que gera graves doenças.
Pedra, elemento de salvação.




Mas quem é o carro? O individuo que o conduz. Se fosse uma pedra sobre uma pessoa seria uma imagem chocante, mas Jimmie Durham já choca só de destruir o carro. Ainda mais para os amantes de automóveis.
Mas essa ação é um start para pensarmos essa máquina criada por nós, e assim como o avião um outro tipo de meio de transporte, que era para ser apenas um meio de nos fazer ir e vir com mais facilidade se transformou  em um meio de fazer guerra, um meio de gerar a morte.
Essas como tantas outras coisas que poderiam ser usadas apenas para o bem e virou uma arma na mão das pessoas.



Será que tais instrumentos terão que ser exterminados literalmente ou eles podem simplesmente serem usados para aquilo que foram projetados.
É apenas uma questão de simplificar as coisas e tornar a vida muito melhor.



Barco. Outro meio de transporte que o homem corrompeu, explorando os mares e rios da forma mais grotesca possível. Acabando com a natureza, acabando com a vida, acabando consigo mesmo.
Essa pedra de olhos e boca mostra uma pedra meio humana, sim, vamos ser os lançadores dessas pedras e romper com essas destruições.







Nesse caso é uma mesa que está sendo destruída. É claro que não se trata de uma mesa de boteco, de plástico, mas sim uma mesa de estilo clássico, da alta sociedade.
Outro objeto que serviria simplesmente para nos alimentarmos, e virou um objeto de status e de poder. Uma forma de quem tem um alto poder aquisitivo poder se diferenciar dos mais desprovidos.
Sendo assim outro paradigma que deveria ser destruído.
Penso que Jimmie Durham não tem a pretensão de destruir objetos, pois eles são tão efêmeros diante da complexidade de suas reações e sim conceitos que já estão ultrapassados. E nós em pleno século XXI ainda damos valor a coisas tão pequenas e que só geram guerra e que geram a destruição humana. Por trás desses objetos quebrados há pessoas destruídas.
Pessoas que são assassinadas pela guerra e pela bomba de um avião, pessoas que são assassinadas por um carro que tem um inconseqüente dirigindo, pessoas que são escravizadas pelo trabalho e que morrem aos poucos para um burguês jantar em uma mesa de luxo.
Matamos pessoas diariamente.
Vamos destruir esses conceitos e reconstruí-los de forma humana.

Filá.












quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

Rupturas de corpo, de gênero, de sexo.


Quando eu vejo esse homem nu, que é Egon Schiele em um dos seus auto-retratos, penso em uma sociedade menos machista, em que ao contrário do senso comum não se trata de uma mulher nua, com seu corpo exuberante dito pelo povo de "gostoso", em que se mostra um corpo seguido pelos padrões de beleza, seios fartos, barriga reta, nádegas carnudas, pernas enchutas, rosto delicado, cabelos longos e preferencialmente loiros.
Ao contrário de tantos requisitos vejo nesse auto-retrato uma quebra de tabus, em que vemos um homem magro, não malhado, como a ditatura da beleza nos impõem. E um homem nu, em que há tanta repulsa pela nossa sociedade em exibir o natural. Simplesmente corpo, o mais belo atributo humano, que sente, fala, reproduz, transa, luta, dança, interpreta, que simplesmente trás vida sobre si.
Não vejo sensualismo nesse auto-retrato e sim um rompimento, rompimento que ele incitou na década de 1910 e até hoje, sobretudo hoje são válidas para nossa sociedade machista, moralista, preconceituosa e entre tantas intolerâncias.


Esse é um outro auto-retrato de Egon Schiele e como tantos outros mostra um tipo de ser dentre tantos seres que temos dentro de nós e tantas máscaras que temos de vestir.
Temos que ser felizes, simpáticos, educados, elegantes, bem vestidos e assim seguimos vestindo máscaras, máscaras que podem estar dentro de nós ou que temos que procurar exteriormente, pois nos é exigido e se você não está disposto a seguir essas exigências será taxado pela sociedade do espetáculo.


Nessa obra que se chama Conversa, vejo mais ainda a expressão do corpo. E em uma conversa está muito presente a expressão de nossos corpos, com sinais, expressões, movimentos. E assim temos que descondicionar nosso corpo que é sempre muito mais voltado para a sensualidade que para a expressão e então efetivar esse atributo e usá-lo para tal forma de comunicação.


Aqui há uma forte expressão da sexualidade, mas não de forma vulgar e pejorativo, mas sim novamente mostrando a naturalidade das ações e necessidades humanas.
Como é belo o entrelaçar dos corpos e o efeito causado pelo ato sexual, de prazer, de amor, de amizade.

Esse é Egon Schiele pintor expressionista que foi preso em 1912 "por ter difundido desenhos imorais" e de sua cela ele escreveu "Criar obstáculos a um artista é criminoso".


Filá.

terça-feira, 4 de janeiro de 2011

Exposição Dengo de Ernesto Neto

Ao entrar em um museu e me deparar com várias redes cheias de bolinhas coloridas, penduradas pelo teto e poder abraçá-las, balançá-las, alem dessas coisas meigas também tive vontade de chuta-las, mas houve um freio da instituição, o chute não para estragar, mas para simplesmente sentir com o pé.
Ver vários instrumentos musicais parados e esperando para ser tocados pelo público, instrumentos de variados estilos, desde piano até pandeiro.
 Estar ali, ver cores que contrastam com meu dia-a-dia preto e branco em São Paulo, estar lá e poder ouvir qualquer um, sem nem precisar ser famoso tocar um instrumento, e até mesmo eu, até sem saber tocar nada poder fazer um batuque, vou até me subestimar  e dizer que fiz uma música por que não? Quem determina o que é ou não uma música? 
 Nossa e os chocolates, balas e guloseimas, quer coisa mais propicia para adoçar sua vida?
Mesmo não os sentindo com o paladar, o olhar sobre esses doces nos faz ter lembranças de momentos de degustação dessas delicias e mesmo não acontecendo ali naquele momento só a lembrança já foi saborosa.
 Estar em um museu e me jogar em uma piscina de bolinhas, descondicionando meu corpo que vive sentado em uma cadeira na sala de aula e me fazendo lembrar da minha infância.
Infância. Devagar sobre a infância que hoje é usurpada pelo mercado das crianças que acabam querendo ser adultas, magras e sensuais, e sonham com suas profissões e não mais em voar, ser uma fada ou um herói.

 Deitar numa piscina de bolinha e relaxar, até mesmo dormir como fez um homem que estava ao meu lado.
Olhar o video de uma cena almejada diariamente pelos trabalhadores do mundo a fora, a imagem de uma praia com um homem abrindo um coco para se tomar sua deliciosa água.
Todas essas sensações podem nos fazer refletir sobre coisas esquecidas e que passam despercebidas em nosso dia tão corrido e cronometrado, e que não nos permite pensar sobre coisas tão simples.




 Essas sensações podem me fazer questionar o porque eu trabalho muito e viajo pouco, e logo não tomo a tão suculenta agua de coco.
Além dessas questões e questionamentos há uma ruptura sobre a instituição museu em que muitas vezes nos oprime e silencia,  mas opostamente me fez  ver, agir e sentir coisas tão diferentes.



Tem também as carteiras que me faz pensar a educação e tentar descondicioná-la igualmente. Todas elas em formato de gatinhos coloridos, tão criativa e inovadora. Contrapondo nossa realidade em que as escolas, em especial as de rede pública  que parecem mais presídios, pintadas de cinzas e que não tem nada de criativo e inovador.
Só faz de seus alunos robos, preparando-os para o mercado de trabalho.
Depositando sobre eles informações e não os fazendo pensar, falar, agir e criar criticamente. Sendo apenas reprodutores de um suposto conhecimento.



Essas são uma das inúmeras questões que podem surgir em nossas mentes ao visitarmos uma exposição de arte.
Questões que não devem ser apenas pensadas, comentadas, devagadas e sim serem urgentemente tratadas.


Filá.

domingo, 2 de janeiro de 2011

A "escolha" tão feita mas tão suspeita

Bom seria se o trabalho fosse uma escolha em que poderíamos optar entre sim, ir trabalhar, e não, não ir trabalhar.
Mas para isso o trabalho teria que ser diferente. Se fosse como é hoje, em que as pessoas se vem como escravas do trabalho, em que nossas vidas se baseiam nele, passamos 8 horas de nosso dia nos dedicando a ele e quando voltamos nosso suposto tempo de ócio acaba se tornando uma continuação do tempo de trabalho, em que acabamos tendo que descansar para o próximo dia. É muito esforço que se faz, e o que ganhamos com isso?
Nada, essa é a verdade, aliás ganhamos muitas coisas, como a depressão, o stress, síndromes, câncer, tudo isso por conta de querer transformar o homem em máquina. E se você não está disposto há quem esteja e você será descartado.
Se continuasse sendo assim, é claro que todos optariam por não trabalhar e todos morreriam de fome pois nosso sistema não permite isso.
Mas para que tudo isso fosse diferente e trabalhar fosse até mesmo um ato de prazer, as pessoas teriam que fazer aquilo que gostassem, seria uma continuação de suas práticas de hobbie e nem veríamos como trabalho.
Será que isso seria possível? Já sei, antes que chegássemos nesse estágio que seria um estágio bem perfeito, uma grande evolução seria se nos dias de hoje, cada um com o seu trabalho fosse bem remunerado. E que não houvesse a "mais-valia", em que um dia de trabalho paga seu salário e o resto de seus dias de trabalho é o lucro do empresário.
Se assim fosse o trabalho automaticamente poderia se tornar prazeroso, pois assim você se sentiria bem retribuído pelo que faz e isso lhe traria prazer. Haveria um tempo efetivo de ócio, para as pessoas poderem pensar, sim, criticamente na vida, no sistema, no além, seja no que for, tempo para práticas culturais.
SIM, isso é possível, precisamos chegar nesse estágio em que os lucros são justamente divididos e que as pessoas são tratadas como humanas e não como máquinas.
Vamos lutar para que isso seja uma realidade e não uma utopia.
E enquanto isso não se efetiva vamos tomar cuidado com a escolha suspeita.


Filá.


Imagem do artista Carlos Zilio.